2020/06/12

SENSATEZ: PRECISA-SE


A atribuição da verba de quatrocentos milhões de euros inscrita na proposta de orçamento suplementar para este ano, com a finalidade de “dotar as escolas, os docentes e os alunos para o desenvolvimento de competências digitais no trabalho escolar”, tem gerado comentários acerbos, que me espantam por alguns deles provirem de pessoas inteligentes.  

2020/05/17

Amanhã: “a teimosia de haver exames” …


Na mais recente entrevista do Primeiro Ministro, este confessou que a decisão mais difícil que teve de tomar face à pandemia foi quando, no dia 12 de Março, anunciou o encerramento das escolas. Na véspera, o Conselho Nacional de Saúde Pública não se pronunciara favoravelmente pelo encerramento generalizado de escolas, esclarecendo que apenas naquelas zonas onde os serviços de saúde o recomendassem se devia fazê-lo. Recordo que a Universidade do Minho encerrara, por deliberação do Reitor, no dia  8, e também estavam fechadas as escolas dos concelhos de Felgueiras e Lousada e algumas da Amadora e Portimão. Existia no entanto uma forte pressão das associações representativas de pais e de escolas, para o encerramento, e começava a falar-se num “alarme social” latente.

2020/05/11

O #EstudoEmCasa


Depois de três semanas de #EstudoEmCasa é possível uma tentativa de primeira avaliação, na generalidade, à iniciativa do Ministério da Educação como resposta à continuação da proibição de abertura das escolas e, portanto, de aulas em regime presencial. Essa análise, porém, limita-se apenas às peças transmitidas pela televisão, não considerando (por desconhecimento) que apoios tiveram os alunos, com ou sem internet, como suportes escritos para professores e alunos, e outros.

É certo que vou deixar sem resposta um dos motivos da minha curiosidade, que era, como disse em texto anterior, saber “como vão ser integrados os elementos fornecidos via TV na programação que os professores irão gizar nas suas disciplinas”.

2020/05/07

Dia Mundial da Língua Portuguesa


Foi ontem o dia mundial da língua portuguesa. Lembremos como no século XVI havia uma preocupação maior do que hoje com a nossa língua.

Floresça, fale, cante, oiça-se e viva
A portuguesa língua, e já onde for,
Senhora vá de si, soberba e altiva.
Se té qui esteve baixa e sem louvor,
Culpa é dos que a mal exercitaram,
Esquecimento nosso, e desamor.
(António Ferreira, Poemas Lusitanos)

'E verdadeiramente que não tenho a nossa língua por grosseira nem por bons os argumentos com que alguns querem provar que é essa; antes é branda para deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar, breve para resolver e acomodada às matérias mais importantes da prática e escritura.
Para falar, é engraçada, com um modo senhoril; para cantar, é suave, com um certo sentimento que favorece a música; para pregar , é substanciosa, com uma gravidade que autoriza as razões e as sentenças; para escrever cartas, nem tem infinita cópia que dane, nem brevidade estéril que a limite; para histórias, nem é tão florida que se derrame, nem tão seca que busque o favor das alheias.
A pronunciação não obriga a ferir o céu da boca com aspereza, nem a arrancar as palavras com veemência do gargalo.
Escreve-se da maneira que se lê, e assim se fala.
Tem de todas as línguas o melhor: a pronunciação da latina, a origem da grega, a familiaridade da castelhana, a brandura da francesa, a elegância da italiana. Tem mais adágios e sentenças que todas as vulgares, em fé de sua antiguidade. E, se à língua hebreia, pela honestidade das palavras, chamaram santa, certo que não sei eu outra que tanto fuja de palavras claras em matéria descomposta, quanto a nossa. E, para que diga tudo, um só mal tem, e é que, pelo pouco que lhe querem seus naturais, a trazem mais remendada que capa de pedinte!'
(Francisco Rodrigues Lobo, A Corte na Aldeia)

Hoje, depois do triste desfecho do acordo ortográfico que parece ninguém querer reconhecer, temos de nos contentar em relembrar os clássicos…

2020/05/04

De desconfinado a desconfiado: reflexões de um velho


Há quarenta e sete dias que não saía de casa. Saí hoje, uma vez que disciplinadamente me foi permitido fazê-lo: fui desconfinado! Não o digo com azedume. Compreendi muito bem que o que me pediam tinha fundamento e abdiquei, com pena mas sem esforço, do hábito que há uns três anos criara de caminhar, todos os dias, perto de cinco quilómetros. Isto a bem da minha saúde futura. Porque, apesar dos meus 84 anos, continuo a pensar que tenho futuro. É evidente que eu sou um privilegiado: estou na minha casa, suficientemente ampla e confortável, com todos os meios de comunicação actualmente disponíveis, com a minha Mulher, e com a assistência da Filha que, embora a distância, continua diariamente connosco, partilhando até, via Skype, as refeições festivas das datas que calharam neste tempo esquisito, os dias do Pai e da Mãe e o dia dos meus anos. Penso muitas vezes em quem não tem esta sorte, os que vivem em lares ou sozinhos, sem família, em condições precárias. Reconheço a dificuldade em tentar resolver o problema, mas esse teria de ter tido, porventura, maior atenção.

2020/04/26

Curiosidades…

Ao reler uns textos publicados n’A Memória Flutuante dos tempos da troika, deparei com um post que começava assim:

Leio no Público de hoje (16 de Agosto de 2011) que Nuno Crato, ao discursar ontem em Gouveia, terá dito que “(m)ais do que computadores ou quadros interactivos o que mais falta faz nas escolas é empenho”.

Sempre revelei a minha discordância com algumas das posições de Nuno Crato, e não resisti a contrariar esta afirmação, não porque discordasse da necessidade de termos nas escolas professores empenhados, mas porque considerava infeliz a pouca importância que o ministro dava às tecnologias.

Hoje, louvamos o empenho dos professores e penalizamo-nos por não termos dado, ao longo dos anos, mais importância à existência (e à utilização) dos computadores.

É curioso, não é?

2020/04/11

Vamos lá ver...


Começo com esta expressão tão comum do nosso Primeiro Ministro porque foi a sua entrevista à LUSA, de que li excertos no Diário deNotícias de hoje, que me levou a, não perdendo o balanço destes últimos dias em que escrevi sobre a revolução que começou e vai continuar este ano com o ensino a distância nas nossas escolas, dizer mais sobre o assunto.

Que disse António Costa? Segundo a entrevistadora, ele afirmou que no próximo ano letivo haverá acesso universal dos alunos dos ensinos básico e secundário à Internet e a equipamentos informáticos, e, questionado se cada aluno vai ter um computador, respondeu: “É muito mais do que isso. É muito mais do que ter um computador ou um tablet. É ter isso e possuir acesso garantido à rede em condições de igualdade em todo o território nacional e em todos os contextos familiares, assim como as ferramentas pedagógicas adequadas para se poder trabalhar plenamente em qualquer circunstância com essas ferramentas digitais".

2020/04/10

Já agora...


… que me abalancei ontem a publicar um texto sobre o futuro deste ano lectivo, vou comentar a decisão de hoje do governo sobre o assunto. Assisti calmamente à longa intervenção do Primeiro-Ministro e ao jogo de perguntas e respostas habitual nestas conferências de imprensa, e ainda que tenham ficado por esclarecer alguns aspectos do que foi aprovado, as linhas orientadoras são claras. Depois, apreciei também reacções de alguns parceiros do Ministério da Educação, que foram, na generalidade, de aprovação.

Percebo perfeitamente a lógica das medidas tomadas. Na situação de emergência em que vivemos queremos que os políticos que governam tomem decisões. Acontece, porém, que precisamente porque a situação é complexa, a tomada de decisões é muito arriscada: por isso o governo aprovou medidas prudentes e aparentemente consensuais. Acentuou sempre a prioridade na luta contra o Covid-19 respeitando as orientações das entidades responsáveis da saúde. Mas ao mesmo tempo aproveitou para temperar essa posição de cautela (“porque ninguém pode prever quando isto acaba”) com a notícia de que o 3º período do ano lectivo começa de acordo com o calendário no dia 14 de Abril…  com toda a normalidade… 

A grande divergência entre o que eu penso seria a melhor solução e a decisão do governo está na manutenção do ensino básico “a distância”, com o tal apoio da Telescola (muito bem encaixada na RTP Memória!) e com avaliação final, exceptuado o exame do 9º ano e provas de aferição. Estarei atento ao que se vai passar mas não auguro que sejam tempos fáceis para professores e alunos estes meses de um ensino “a distância” misto.  É grande a minha curiosidade acerca de como vão ser integrados os elementos fornecidos via TV na programação que os professores irão gizar nas suas disciplinas. E temo que a imposição de uma avaliação de contornos perigosamente vagos venha a causar grandes perturbações. Perdoe-se-me o que vou dizer: houve falta de coragem para tomar a decisão certa, isto é, não haver qualquer avaliação. Não vejo como vai ser possível um docente definir uma avaliação que objectivamente considere justa para todos os alunos nestes tempos conturbados.

De resto, as medidas tomadas estão de acordo com o que expus ontem. A conclusão do secundário teria sempre de ter um exame – a não ser que a entrada no ensino superior fosse diferente. Devia ser, aliás – mas isso é outro problema e nunca seria desejável uma mudança sob pressão das circunstâncias.

Temos definido um percurso para os próximos meses de um ano escolar algo complicado, único. Apesar das minhas reticências em relação à solução ensaiada para o ensino básico (e nem sequer quero ter a presunção de ter razão) quero acreditar que todos os intervenientes no processo vão fazer o seu melhor. E – quem sabe! – até pode acontecer que desta experiência improvisada por uma circunstância fortuita se possam encontrar pistas inovadoras a considerar num futuro.

2020/04/08

Consequências do Covid-19 na educação: que fazer do resto do ano lectivo?


Tenho pensado em como se pode (ou, talvez com mais propriedade, como se deve) decidir o complicado problema do presente ano lectivo, interrompido pelo surto do Covid-19. Algumas vezes, faço-o como se partilhasse alguma responsabilidade como quadro do Ministério da Educação (situação em que estive no passado durante uns anos); outras como professor, que fui durante muito tempo: cerca de nove anos no ensino secundário, dois numa escola do magistério primário, e mais de vinte no ensino superior (politécnico e universitário), neste último caso como docente, tendo exercido alguns cargos de gestão.

É verdade que há praticamente catorze anos estou afastado das lides escolares, mas acredito que apesar das mudanças – ou, talvez, por causa delas – o meu pensamento não terá perdido a vertente de coerência que sempre quis manter. Por isso senti-me hoje tentado a pôr por escrito o que tenho pensado. Previno que o que vou dizer aplica-se quer ao ensino dispensado pela escola pública quer ao privado. E ainda que não faço qualquer referência aos alunos que na escola inclusiva (que se deseja) tenham dificuldades de aprendizagem.  

2020/03/27

Notícias do nosso Serviço Nacional de Saúde


Hoje de manhã recebemos uma chamada telefónica. Era a Enfermeira Catarina do Centro de Saúde da nossa área de residência. Queria saber como estávamos, minha Mulher e eu, e se, estando bem, precisávamos de qualquer apoio, uma vez que não devíamos sair de casa. Perante a nossa negativa, quis saber se tínhamos alguém que nos ajudasse, e descansou quando lhe dissemos que a nossa filha estava sempre em contacto connosco. Despediu-se dizendo que em qualquer momento que fosse preciso a procurássemos no Centro.

Tendo em atenção o momento tão complicado que todos os serviços de saúde vivem, o que conto merece uma consideração especial pelo que significa: as preocupações com a população idosa. O que prova que o nosso Serviço Nacional de Saúde, e reforço, neste momento tão delicado, está a corresponder aos princípios gerais consignados na nossa Constituição.

No meio de um ambiente pesado e incerto, este telefonema fez-me bem.

PS – Qualquer um (ou uma) dos críticos do SNS (e de tudo…) seriam capazes de dizer: “O quê? Então só contactam agora? Isso devia ter sido feito há duas semanas… Uma vergonha de serviço!” Ficariam sem resposta: nunca são capazes de ter uma visão abrangente da realidade.

2020/03/25

Apontamento para memória futura


São nove horas. Há um silêncio de domingo. E é quarta-feira. Há cinco anos que moro aqui – numa avenida onde há trânsito intenso às horas de ponta, que, apesar das janelas com vidro duplo, se apercebe claramente dentro de casa. E hoje, como há dias, não. Fui há pouco à janela: a avenida está praticamente sem trânsito (descem três ou quatro carros, sobem um ou dois). No passeio que posso ver ninguém sobe ou desce. Pensava, nestes últimos dias, que quase não passavam ambulâncias. Mas não é verdade: elas continuam a passar, que este é caminho natural para Santa Maria; só que não precisam de sirene porque têm a via desimpedida. No céu, nada de aviões que demandam o aeroporto, que dista escassos quilómetros da minha casa: desde há dias tem sido um sossego. De algum modo poderia dizer que a vida, se não parou, está em pausa, em Lisboa. É estranho.
A esta hora eu costumava sair para fazer a minha caminhada diária, mais ou menos cinco quilómetros, pelas redondezas: Campo Grande, Alvalade, Avenidas do Brasil, de Roma, da República, Saldanha… faço isto há quase cinco anos, para não enferrujar. Pois é. Há uma semana pus de parte este hábito que me ajudava a equilibrar o peso. Compreendi que o devia fazer, sou um dos cidadãos com risco elevado face à epidemia, e ainda que não me pareça que as minhas caminhadas fossem muito susceptíveis, por si só, de serem perigosas, senti que devia aceitar o “mais vale prevenir…”
Para além dessa hora, hora e pouco, de caminhada, eu estava em casa. Por isso esta clausura, que sinto e aceito agora obrigatória, não me custa muito. Tenho sempre com que me entreter, há muito tempo que ando a organizar papéis, transformando-os em pdf, e continuo a escrever. Passo os olhos por alguns jornais na Net e visito dois ou três blogs que estimo. Vejo alguns programas de televisão e, recentemente, recomecei a usar o leitor de DVDs, revendo alguns que há muito estavam em pousio.
Estou preocupado? Como diria o nosso Primeiro Ministro, “vamos lá ver…” Nem eu nem ninguém teve uma experiência igual, porque a grande epidemia mundial, a “nossa” pneumónica, ou febre espanhola para a maior parte, foi há cem anos, e mesmo os centenários existentes seriam muito crianças para terem memória directa desses tempos. Eu tive relatos dos meus pais, que eram jovens na altura e, felizmente, não foram afectados pela doença – e contaram-me coisas terríveis. Esta pandemia, a Covid-19, é na verdade algo muito sério, e que, penso, só não será ainda mais sério por ter surgido quando a humanidade já dispõe não só de conhecimento prévio como de condições científicas e técnicas de eleição. Por isso, apesar do ritmo assustador a que a doença se espalha e das situações tão graves e tão próximas da Itália, da Espanha, e de outros países, creio que iremos vencer a crise – e por isso estou apenas moderadamente preocupado.
Contudo, talvez levado pelas análises de economistas, que têm a obrigação de saber do que falam ou escrevem, o que me preocupa verdadeiramente é o “depois” da pandemia. E não só em termos económicos, que podem de facto ser muito, mas muito sérios, mas pelo que eles podem trazer a reboque – desestabilização social e política a diversos níveis. Ninguém quererá regressar a tempos bem próximos. A incerteza agrava a preocupação. Como estaremos nós, que seremos nós, daqui a três meses? No Natal?
Por isso deixei aqui estas linhas, para memória futura.