2017/12/06

Est modus in rebus


Estudei Latim no Liceu (como Grego, também) e aprendi algumas das muitas frases que têm perdurado no tempo como expressão de sageza. Esta foi uma delas, e tenho-a como das mais avisadas. Sugere a moderação, de que nas coisas há sempre uma medida a ter em conta.

Por que me veio de novo à mente esta expressão latina? Por causa da notícia acerca dos resultados do PIRLS (Progress in International Reading Literacy Study), um estudo de avaliação comparada levada a efeito pela IEA (International Association for the Evaluation od Educational Achievement) a partir do Boston College’s Lynch School of Education, o qual se realiza periodicamente desde 2001. Com o estudo, pretende-se avaliar o grau de literacia dos alunos frequentando o 4º ano de estudos regulares em 50 países de todo o mundo. Portugal é um desses países.

Os resultados desse estudo para 2016 foram agora divulgados (ver aqui). As notícias dos jornais dão ênfase a uma descida dos resultados dos alunos portugueses, de 13 pontos, em relação à avaliação anterior, sendo mais evidente nas meninas do que nos meninos (naquelas o desvio é de 19 pontos). O Secretário de Estado da Educação, segundo a imprensa, sugeriu que as razões desta descida estariam nas alterações curriculares promovidas pelo ministro Nuno Crato, uma vez que os alunos testados pertencem à coorte correspondente aos anos da sua “reforma”. Evidentemente o ex-ministro já veio responder a esta insinuação, lembrando o que se passou há um ano quando os resultados do PISA foram divulgados.

Est modus in rebus. Em posts anteriores deixei bem claro o que penso do ministério de Nuno Crato – foi péssimo. Isso não invalida que, neste caso, ache inapropriada (direi mesmo abusiva) a ligação dos resultados da avaliação do PIRLS à política seguida nesses anos.

Em relação a avaliações internacionais (o mesmo se passa com o PISA) é necessário, porventura mais necessário do que em avaliações nacionais, ter muita prudência na leitura dos resultados. O número e qualidade de variáveis em jogo é elevado, as amostras (escolhidas? obtidas aleatoriamente? apenas casuais?) poderão estar longe de ser equivalentes de um para outro estudo, e o próprio contexto nacional pode significativamente condicionar os exames. 

Pessoalmente não me comovo muito com resultados que se traduzem em “rankings”. Devem as avaliações ser sempre convertidas em números? A expressão numérica é cómoda, mas nem sempre exprime a verdade de uma situação que se pretende compreender, mais do que etiquetar.


É evidente que quando em sucessivas avaliações se começam a desenhar tendências, elas devem ser entendidas como realidades e interpretadas como tais – por exemplo, os bons desempenhos continuados de estudantes da Coreia do Sul têm de ser interpretados para encontrar as razões desse êxito. Mas pequenas alterações como a que motivou esta prosa (numa escala de 700 pontos, passar de 541 para 528), não devendo ser ignoradas, nem minimizadas, não passam disso mesmo – pequenas alterações. A ser corrigidas, ou confirmadas, na próxima edição do estudo.

2017/11/10

Maria Emília Brederode Santos


A presidência do Conselho Nacional de Educação (CNE) é, desde ontem, de Maria Emília Brederode Santos, eleita pela Assembleia da República há semanas. O Conselho Nacional da Educação é, em teoria, um importante órgão na estrutura da educação do país, ainda que, sendo consultivo, apenas tem um poder de influência e não de decisão. Ao longo dos seus trinta anos de existência o CNE tem cumprido a sua missão e as diferentes presidências podem considerar-se positivas.

A eleição de Maria Emília Brederode Santos é uma boa notícia. Sendo uma das expatriadas que regressou a Portugal depois do 25 de Abril, com uma licenciatura em ciências da educação pela Universidade de Genebra, tem tido desde então actividade relevante, quer colaborando na esfera do Ministério da Educação (presidente do Instituto de Inovação Educacional entre 1997 e 2002 e seu representante em conferências internacionais)  quer em outras iniciativas (e entre elas relevo a direcção pedagógica da versão portuguesa da “Sesame Street”, transmitida pela RTP).

A Maria Emília tem, da educação, uma visão humanista, sobressaindo no seu currículo um interesse persistente pela arte: foi presidente da Associação Portuguesa e Intervenção Artística e de Educação pela Arte e de um Grupo Interministerial para o Ensino Artístico, em meados da década de 90, e participou na avaliação de uma das mais interessantes experiências que remonta ao tempo de Veiga Simão, a Escola Superior de Educação pela Arte, da qual resultou um livro publicado pelo Instituto de Inovação Educacional em 1994.

Aguardo com expectativa a acção da nova Presidente do CNE, confiando na sua capacidade de, sempre discreta, saber encontrar os consensos necessários numa altura em que se pretende que exista um salto qualitativo na educação em Portugal. 

2017/10/09

Os nossos 70 anos…


Desde há muito que um grupo de alunos que faziam parte da turma A do 1º ano do Liceu de Passos Manuel, em Lisboa, no ano de 1947, se reúnem, para, primeiramente num jantar, ultimamente, num almoço, no dia 7 de Outubro (ou num dia próximo), lembrarem os seus primeiros tempos de alunos liceais. Isto porque as aulas, nesses tempos longínquos, começavam efectivamente no dia 7 de Outubro. Infelizmente já não estão todos vivos, mas ainda somos uma dezena os que marcam quase sempre presença nesses encontros, já todos octogenários mas em boa forma.

Hoje lembrámos que ocorre neste ano de 2017 o 70º aniversário da nossa entrada no Passos. Um de nós, autor de um blogue – “Velhos são os Trapos” – publicou um post que considero notável, e outro decidiu levar para o almoço um bolo de aniversário de que deixo uma memória fotográfica do que dele restou.



Durante umas duas horas, convivemos lembrando um passado que cimentou amizades e uma escola que nos marcou. E, claro, não deixámos de conversar sobre a actualidade…  

2017/09/10

O novo ano escolar


Desde o meu último post (Novidades na educação?) tenho acompanhado discretamente a evolução das decisões do Ministério sobre as alterações propostas, sem qualquer informação que não seja a que tem saído na comunicação social, a qual nem sempre prima quer pela objectividade quer pelo conhecimento fundamentado sobre o que analisa.

Ao aproximarmo-nos do inicio do ano escolar de 2017-2018 as notícias tornam-se mais explícitas. No Diário de Notícias de ontem um artigo de página inteira da autoria de Pedro Sousa Tavares tem como título “O ano em que um quinto das escolas reaprendem a ensinar”. No Expresso, também de hoje, Isabel Leiria intitula a sua prosa: “Sumário: Este ano vamos ensinar de forma diferente”.

Curiosamente, verifiquei que ambos os artigos, factual e interpretativamente, são mais escorreitos do que muitos outros. Eu preferiria que os títulos enfatizassem mais o aprender do que o ensinar, porque na verdade o que está em causa é a aprendizagem dos alunos; claro que a vertente ensino existe, mas diferentemente do que é normalmente entendido. 

De qualquer modo, os jornalistas não esqueceram dizer que a “novidade” que se vai tentar introduzir nas escolas portuguesas não é novidade alguma, porque nos anos finais do século passado muitas escolas experimentaram a flexibilidade curricular e o processo só não teve sequência porque o apoio que o Ministério deveria ter proporcionado foi descontinuado com a chegada de um novo ministro. Não deixam também de apontar o que podem ser os aspectos positivos da flexibilização e de referir as dúvidas e apreensões que podem existir face ao modo como se vai desenvolver esta situação, que podemos caracterizar como experimental.

Não tenho dúvidas de que, se bem conduzido, o processo de flexibilização tem condições de êxito, como se pode deduzir do que se passou entre 1997 e 2001 em muitas escolas, e está documentado em várias publicações. Que entendo por processo bem conduzido?

Em primeiro lugar, que o Ministério da Educação disponibilize um apoio claro e eficiente às escolas participantes, quer pelas suas estruturas, quer contratualizando esse apoio com as instituições de ensino superior que tenham departamentos de educação (existem em todos os distritos). Que seja claro na definição do que se pretende e, como um dia disse perante uma situação de desconchavo, que não seja inflexível num projecto que se pretende flexível…

Em segundo lugar, nas escolas onde se desenvolve a flexibilização curricular é necessário que existam lideranças fortes. Lideranças, não liderança; fortes, mas não autoritárias. O director da escola é por natureza líder, mas para as diversas áreas outros líderes terão de emergir, que privilegiem o diálogo mas tenham capacidade para gerar acordos e garanti-los. A nova estrutura que se pretende nas escolas é aliciante, mas exige muito dos professores. Eu não tenho ilusões: nem todos os professores estão preparados para o desafio que lhes é proposto. Um professor que não se sinta capaz de participar não deve ser obrigado; tem de se lhe dar tempo para interiorizar as novas competências que lhe são pedidas.

Um dos comentários de alguns professores que têm aparecido realça que no fundo a “novidade” nem é novidade, porque muitos docentes já praticam o trabalho de projecto, a aprendizagem cooperativa, já têm fugido ao programa… É certo, e tenho conhecimento pessoal de quem, desde há muito tempo, tenha integrado no processo de ensino-aprendizagem nas suas classes elementos que se aproximam do que é proposto na flexibilização curricular. Contudo, o que se espera agora das escolas é diferente, porque implica um trabalho muito mais colectivo, uma programação cuidada e uma atenção constante aos pormenores.

Para quem, como eu, defende este tipo de abordagem à organização do trabalho nas escolas, haverá lugar a qualquer apreensão? Certamente que sim. Ao contrário do que aconteceu há cerca de vinte anos, as escolas (os professores) tiveram pouco tempo de preparação. Enquanto na altura decorreram quatro anos de preparação, agora podemos dizer que tudo se decidiu num ano. Esta circunstância reforça o que apontei acima – o Ministério tem de ter um apoio constante e eficiente.

Por outro lado, o que vai mudar é importante demais para se correr de novo o risco de dentro de algum tempo alguém com poder de decisão entender desfazer o que se vai construir. E não estou certo que isso não possa acontecer. De facto, durante muito tempo assumi que havia entre as forças políticas no país um relativo consenso quanto ao essencial na educação – ainda o acreditava na viragem do século. A evolução posterior mostrou que esse relativo consenso se esfumou, atingindo a rotura quando Nuno Crato teve a responsabilidade do Ministério da Educação.

Seria bom que num futuro muito próximo fosse possível, em relação à educação, encontrar linhas programáticas que fossem aceites e assumissem carácter vinculativo. O que está a ser feito, neste momento, parece ser um bom princípio.



2017/04/12

Novidades na educação?


Há muito que não publico, nem aqui, n'A Memória Flutuante, nem na Destreza das Dúvidas. "No excuses", culpa minha.

Deixando de lado possíveis razões para a parca assiduidade, relevarei hoje um tema que tem sido aflorado nos últimos tempos e que se insere na política de reversão de medidas tomadas em governos anteriores e que foi anunciada como “flexibilização curricular”.

Disse-o na altura, era indispensável que muitas das medidas tomadas pelo ministério de Nuno Crato fossem alteradas. A que foi há tempo anunciada, e que já tinha sido objecto de algumas declarações do Secretário de Estado João Costa, deixa-me simultaneamente satisfeito e preocupado. Satisfeito, porque, no fundo, ela retoma a decisão que, no virar do século (em 2001), definiu uma alteração importante na vida das escolas, que foi conhecida por “gestão flexível dos currículos”, para a qual contribuí com a convicção de que se tratava de uma das mais importantes decisões para a melhoria das escolas no nosso país. Preocupado, porque a experiência desses tempos reforçou a ideia de que grandes mudanças em educação não podem ser impostas e necessitam de tempo e de um apoio efectivo para a maior parte das escolas. É verdade que o Ministro Brandão Rodrigues, de acordo com uma notícia do Público de 9 de Abril, garantiu que “as escolas estão no caminho”, com a ajuda da tutela, para terem “todas as condições” que permitam a realização do projecto de flexibilização curricular. Permito-me no entanto ter as maiores dúvidas sobre este ponto. Embora desconheça que tipo de apoios tem o Ministério preparado para dar resposta aos problemas que necessariamente vão surgir, parece-me que os professores ainda não estarão “prontos”, para não falar das escolas, para a “novidade” (há quinze anos que a ideia da flexibilização foi deixada cair).

Permitam-me uma breve notícia histórica.

Nos finais dos anos 80 do século passado, na sequência da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº 44/86, de 14 de Outubro) e dos trabalhos da Comissão da Reforma do Sistema Educativo, no tempo do ministro João de Deus Pinheiro, foi posta em execução uma reforma curricular que, mau grado as excelentes ideias concebidas no seio de um dos grupos de trabalho da referida comissão, não produziu um documento claro, e mau grado alguns resultados interessantes (na chamada Área Escola) revelou-se decepcionante.

No entanto, a ideia de currículo (termo pouco usado até então, mas que já era objecto de ensino nas escolas de formação de professores) passou a ser mais conhecida. Algumas iniciativas de investigação desenvolvidas tiveram mesmo  alguma projecção, como o “PROCUR – Projecto Curricular e Construção Social” na Universidade do Minho, que propunha a construção do currículo na escola. Em 1995, eu próprio publiquei um artigo na Revista Colóquio – Educação e Sociedade, intitulado “Caminhos para a descentralização curricular”, no qual advogava a autonomia dos professores como gestores do currículo, libertando-se do excessivo centralismo do sistema educativo nacional.

Esta ideia da flexibilização curricular desenvolveu-se no tempo do Ministro Marçal Grilo e da Secretária de Estado Ana Benavente, a partir de uma iniciativa muito interessante que envolveu escolas e professores de todos os ramos de ensino e que ficou conhecida por “Reflexão participada sobre os currículos do ensino básico” (depois alargada ao secundário). Praticamente, todos os professores e escolas, incluindo as do ensino superior, foram convidados a pronunciar-se sobre uma proposta de reorganização curricular que pretendia, mais do que “reformar”, reenquadrar o currículo numa perspectiva pedagogicamente mais consequente com o que se deve entender por educação.  

Os resultados desse inquérito foram objecto de publicação em Relatório circunstanciado. O então Departamento da Educação Básica publicou vários pequenos livros sobre o tema (por exemplo, Gestão Curricular. Fundamentos e Práticas, da autoria de Maria do Céu Roldão), mas outros surgiram, patrocinados por editoras, que promoveram acções de formação em todo o país.
 


 Logo após a divulgação do Relatório o Ministério da Educação decidiu a abertura de um relativamente largo período de “experimentação” (as aspas indicam que não teve nunca as características de uma verdadeira experimentação, mas serviu para se poderem tirar conclusões credíveis) que ocorreu entre 1998 e 2001. Foi criado um “Conselho de Acompanhamento do Desenvolvimento dos Projectos de Gestão Curricular Flexível”, representativo de diversas instâncias educativas, que desde 1997-98 a 2000-2001, esteve atento às várias escolas que se dispuseram a flexibilizar o currículo, apresentando-se a concurso. Em 1997-1998 o projecto foi implementado em apenas 10 escolas; em 1998-1999 o número de participantes foi 39; e as escolas interessadas foram aumentando, 93 em 1999-2000 e 187 em 2000-2001.

Na altura, as opiniões de professores e técnicos da educação dividiam-se: havia quem tivesse aderido convictamente ao projecto e quem duvidasse da sua exequibilidade. Incluía-me no grupo dos primeiros. Estava – e estou – completamente de acordo com colocar nas mãos dos professores (podia escrever das escolas, mas prefiro ir direito aos executantes principais) a gestão pedagógica das aprendizagens dos seus alunos.

Entretanto, o Ministério da Educação, baseado nos indicadores obtidos, publica em Janeiro de 2001 a legislação que contempla a reorganização curricular dos ensinos básico e secundário. No caso do ensino básico, o currículo é entendido como o meio de os alunos adquirirem as competências que lhes permitam aprender ao longo da vida, através das diferentes linguagens – as línguas, a matemática, a gestual, a estética – mas também que aprenda a ser cidadão e a obter a informação necessária para aprender. Por isso surgem novidades como a criação de áreas curriculares não-disciplinares, Projecto, Estudo Acompanhado e Formação Cívica, bem como a sugestão de formações transdisciplinares, com especial relevo para a Educação para a Cidadania e para as Tecnologias da Informação e Comunicação. Foram também introduzidas actividades de complemento curricular (como o Inglês no caso do 1º ciclo).

O Departamento de Educação Básica publica, entretanto, dois livros, em 2001 e 2002, ambos com o título Gestão Flexível do Currículo, o primeiro com o subtítulo Escolas Partilham Experiências, e o segundo com o subtítulo Reflexões de Formadores e Investigadores. Os textos, de um modo geral, avalizavam a decisão tomada.


Estávamos, no entanto, num período conturbado: em Dezembro de 2001 a demissão do governo vai levar a uma mudança política e quando, em Abril de 2002, o novo governo toma posse, o Ministro designado, David Justino, ainda que não tenha revogado legislação, mostrou claramente que não era a favor do que se estava a construir. E sem apoio do Ministério pode dizer-se que aí acabou o projecto da gestão flexível do currículo. O óbito só foi lavrado em 2012, com a publicação do Decreto-Lei nº 139/2012, de 5 de Julho.

O retomar de princípios que restituem às escolas e aos professores a gestão curricular, o que não sendo tarefa fácil é uma tarefa nobre, própria de profissionais, mesmo que tenha ressuscitado a ira dos que pensam a educação como o puro acto de transmissão de conhecimentos, dá-nos esperança que desta vez não se perca a oportunidade de assumir a educação como um processo global, o que cada vez mais se torna imprescindível num mundo que está a mudar muito mais depressa do que o que pensávamos há vinte anos.

Reparei que, ao começar a escrever este texto, coloquei no título um ponto de interrogação. Novidades? Bom, em parte.




2017/02/14

A ter em conta na política educativa

Não tenho cumprido o que de algum modo me propus ao aceitar o convite para colaborar no DdD – publicar posts sobre educação, tal como faço n' A Memória Flutuante. Depois de tê-lo feito numa fase inicial, a pouco e pouco perdi a vontade. Talvez esta pouca apetência tenha a ver com um certo distanciamento da acção do Ministério da Educação do actual governo, que embora satisfizesse um objectivo que me agradou – eliminar os desvios de Nuno Crato ao que vigorava antes do seu consulado – não fazia mais do que tomar medidas avulsas.

Acontece que, neste momento, há razões para deixar de estar silencioso. Menos de um ano depois de ser constituído um grupo de trabalho com a finalidade de definir o “perfil do aluno para o século XXI”, foi apresentado um documento com esse mesmo título (que pode ser obtido aqui) e que está em consulta pública até ao dia 13 de Março.

É um documento relativamente curto, o que é bom. Futuros desenvolvimentos serão necessários, mas para já o que é dito é suficiente. Expõe com clareza princípios que nem sequer são uma novidade: o que se propõe (com diferenças devidas à óbvia distância temporal) é o que foi pensado e executado no tempo do Ministro Marçal Grilo e da Secretária de Estado Ana Benavente e que levou à reorganização curricular dos ensinos básico e secundário do início do século. Infelizmente a força dessa mudança esmoreceu com rapidez: lamentavelmente, os governos posteriores, todos, não deram suporte ao que fora feito.

Como é óbvio, a proposta que está, a partir de agora, em discussão, tem uma dimensão ideológica clara, definidora de uma política educativa. Por isso haverá quem a conteste pelo seu cunho humanista, pela valorização das competências (ostracizadas por Crato), por voltar a propor a flexibilização curricular. Como fiz no passado, defendo abertamente esta visão da educação. Mais: continuo a pensar que só com currículos flexíveis se podem eliminar as altas percentagens de insucesso nas nossas escolas, sem que isso signifique que todos os alunos não cumpram os objectivos fixados previamente.

Seria bom que qualquer decisão sobre este assunto tivesse a maior convergência possível, para que um futuro governo de cor diferente (ou, até, da mesma cor, mas com um ministro diferente!) não se lembrasse de mudar outra vez, estabelecendo outros princípios.


Há ainda um problema fundamental a referir. Nenhuma alteração em educação terá êxito se quem tem de executá-la não a sentir como sua. No final dos anos 90 do século passado, tentou-se, através de um projecto interessante de envolvimento de escolas no processo de reorganização, que um número considerável de professores assumisse as novidades. Há, aliás, relatos dessas vivências que mostram como foram positivas. Seria lastimável que não se cuidasse, com tempo e meios, de estabelecer um programa de informação e formação adequado que motive os professores a actuarem de acordo com os princípios definidos.