Foi ontem o dia mundial da língua portuguesa. Lembremos como
no século XVI havia uma preocupação maior do que hoje com a nossa língua.
Floresça,
fale, cante, oiça-se e viva
A portuguesa
língua, e já onde for,
Senhora vá
de si, soberba e altiva.
Se té qui
esteve baixa e sem louvor,
Culpa é dos
que a mal exercitaram,
Esquecimento
nosso, e desamor.
(António
Ferreira, Poemas Lusitanos)
'E
verdadeiramente que não tenho a nossa língua por grosseira nem por bons os
argumentos com que alguns querem provar que é essa; antes é branda para
deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar,
breve para resolver e acomodada às matérias mais importantes da prática e
escritura.
Para falar,
é engraçada, com um modo senhoril; para cantar, é suave, com um certo
sentimento que favorece a música; para pregar , é substanciosa, com uma
gravidade que autoriza as razões e as sentenças; para escrever cartas, nem tem
infinita cópia que dane, nem brevidade estéril que a limite; para histórias,
nem é tão florida que se derrame, nem tão seca que busque o favor das alheias.
A
pronunciação não obriga a ferir o céu da boca com aspereza, nem a arrancar as
palavras com veemência do gargalo.
Escreve-se
da maneira que se lê, e assim se fala.
Tem de todas
as línguas o melhor: a pronunciação da latina, a origem da grega, a
familiaridade da castelhana, a brandura da francesa, a elegância da italiana.
Tem mais adágios e sentenças que todas as vulgares, em fé de sua antiguidade.
E, se à língua hebreia, pela honestidade das palavras, chamaram santa, certo
que não sei eu outra que tanto fuja de palavras claras em matéria descomposta,
quanto a nossa. E, para que diga tudo, um só mal tem, e é que, pelo pouco que
lhe querem seus naturais, a trazem mais remendada que capa de pedinte!'
(Francisco
Rodrigues Lobo, A Corte na Aldeia)
Hoje, depois
do triste desfecho do acordo ortográfico que parece ninguém querer reconhecer, temos
de nos contentar em relembrar os clássicos…