2019/07/29

Recordando…



Há  sessenta  anos, no dia 29 de Julho  de 1959, completei a  licenciatura  em  Ciências  Históricas  e Filosóficas na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com a defesa da tese que para o efeito elaborara: A arqueologia do  concelho  de Torres Vedras. Contribuição para o seu estudo até à época Lusitano-Romana. Era o  primeiro  final  da  minha  vida escolar – voltaria à escola mais vezes – mas esse primeiro passo ficou bem gravado na minha memória.

Para quem não saiba – e muitos não saberão – vou dizer em que consistia uma licenciatura nesses anos 50 do século XX. A entrada na Universidade dependia da aprovação de um dos cursos terminais do ensino liceal, de sete anos, que estavam agrupados em alíneas. A alínea d) era a que conduziria ao curso que eu escolhera, a alínea e) dava acesso a Direito e a f) aos muitos cursos da Faculdade Ciências ou Engenharias. Quem obtivesse a média de 14 valores, entrava directamente na Universidade; quem não a alcançasse teria de fazer um exame de admissão.

No caso do meu curso, ele consistia em quatro anos de “cadeiras”, como se dizia então, umas anuais, outras semestrais. Ao todo eram 26 – 13 de matérias de História e 13 de matérias de Filosofia. Todas elas tinham exames de frequência e final – provas escritas, as orais eram muito raras – e havia uma época de recurso para quem reprovasse no final do ano (ou quisesse melhoria de nota). Terminadas todas as cadeiras com aprovação, o aluno teria, para obter o grau de licenciado, de elaborar uma tese original com tema de sua escolha e defendê-la perante um júri que tinha, alem disso, a tarefa de interrogar oralmente o candidato em quatro matérias: História de Portugal, História das Civilizações, História da Filosofia Moderna e Contemporânea e Psicologia. Havia ainda uma prova escrita prévia de Lógica…

Depois dos quatro anos do curso, o ano seguinte era reservado para a elaboração da tese e preparação dos exames. Em rigor, quem quisesse poderia requerer o exame no 4º ano, mas como se compreende era uma tarefa muito difícil, ainda que não impossível: o Doutor Oliveira Marques fê-lo (creio que em 1958). Eu nem sequer considerei a hipótese! O tema da tese que escolhi exigia muito trabalho no exterior, quer em museus, colecções particulares, quer em bibliotecas e mesmo em trabalho de campo. Eu tinha-me rendido à arqueologia pré-histórica e por isso procurei fazer um trabalho exaustivo, que acabou por ficar materializado em dois grossos volumes – um de texto e outro de gravuras, o primeiro com 294 páginas e o segundo com 99.


Foi precisamente há sessenta anos, neste dia 29, que defendi a minha tese. O arguente foi o Prof. Manuel Heleno, que era o professor catedrático da área, e as coisas correram bem, sendo menores as objecções feitas ao que escrevera. O resultado não correspondeu inteiramente ao que desejava, mas a culpa não foi da tese, mas de uma prova que me correu francamente mal, a de História de Portugal. Não quero desculpar-me, mas a Professora Virgínia Rau devia ter dormido mal na noite anterior e resolveu brindar-me com questões que me deixaram literalmente a “ver navios”… Em suma, tive 14 valores como nota final de licenciatura.

Mesmo assim festejei. Alcançara o diploma que me permitiria trabalhar como professor. Mas acalentava, confesso, a possibilidade de continuar a estudar e evoluir em arqueologia. Tal não aconteceu – são outras histórias que nem vale a pena recordar aqui. Dois meses depois, iniciava a minha carreira como professor no Liceu Nacional de Santarém. A arqueologia continuou a ser um hobby, durante alguns anos, e depois foi substituída pelo empenho total nas coisas da educação.  

Perdoe-se-me esta evocação muito pessoal. Mas sessenta anos é mesmo muito tempo, e os velhotes gostam destas coisas…