Conheço esta estrada de anteriores estadias no Vimeiro, sei que há troços em que a as árvores fazem túnel e proporcionam uma frescura agradabilíssima, e que há outros desabrigados, nos quais as árvores foram substituídas por taludes. Já não me lembrava era dos canaviais que bordejam a estrada em vários passos. Ou não existiriam? Seja como for, apetece-me arrancar uma cana seca e retirar-lhe as folhas, que ainda cortam se não tivermos cuidado. E ao fazê-lo, recuo aos tempos de criança, lembrando-me, com uma nitidez que me espanta, de passeios que dava com o meu Pai, quando íamos ao “campo”, como dizíamos então… Não era difícil, vivíamos nessa altura no Seixal, que não era mais do que uma pequena vila onde predominavam operários e pescadores, e na qual, logo que se saía do centro, existiam largas zonas de matas, hoje desaparecidas… Muitas vezes passeávamos nessas matas e não era raro que o meu pai arranjasse uma cana de boa dimensão e, com auxílio de um canivete que sempre o acompanhava, conseguisse fazer uma flauta rudimentar. O meu pai sabia alguma coisa de música, o que não acontece comigo, e devia encantá-lo aquele trabalho que eu seguia com muito interesse – se o relembro hoje! Perguntei-me, ao desfolhar a cana que apanhara, por que o fizera. E a única resposta que tive foi que talvez tivesse sido um acto vindo do inconsciente, em memória do meu Pai e do que a ele devo na vida. Não, eu não saberia fazer a flauta. Não trago sempre comigo um canivete, aliás… Ao chegar perto do fim do passeio, deixei a cana encostada à última das sebes. |
Estrada da Fonte dos Frades (Vimeiro)