Na quinta-feira passada, à margem de um seminário para formadores do Instituto do Emprego e Formação Vocacional, uma participante manifestava os seus receios sobre a influência que o paradigma de Bolonha poderia ter nas aprendizagens dos alunos das nossas escolas superiores. Não está isolada, mas no contexto do seminário, que estava ser conduzido com base em estratégias que se aproximam das que, a meu ver, importa consolidar no ensino superior, valorizando o trabalho do aluno, e que estavam a ser bem aceites pelo conjunto dos formandos, esta ideia de um formador fez-me pensar.
Ora ontem, sexta-feira, aconteceu na minha Universidade um evento notável. Sem podermos generalizar, existe na UM (Universidade do Minho) um número de docentes realmente preocupados com Bolonha e querendo tirar partido das potencialidades da mudança estrutural que pressupõe. Assim, neste ano de 2004-2005, as Escolas de Engenharia e de Ciências, com o aval dos Conselhos Científicos e do Conselho Académico e o patrocínio da Reitoria, levaram a efeito experiências preludiando o que virá a ser a Universidade do futuro. Ontem, o Curso de Licenciatura de Engenharia e Gestão Industrial apresentou, em sessão pública, os resultados da sua experiência. Em linhas gerais, foi a seguinte. No segundo semestre do 1º ano do curso o currículo em vigor materializa-se nas disciplinas de Análise Matemática, Elementos de Engenharia de Produção e Sistemas, Elementos de Microinformática, Física II, Linguagens de Programação e Química Geral.
Estas disciplinas pertencem a diferentes Escolas e Departamentos (de acordo com a filosofia organizacional da UM). Os docentes reuniram-se e programaram em conjunto as suas actividades em torno de um projecto proposto aos alunos, “Produção de Biodiesel”, o qual implicava aprendizagens dessas diferentes disciplinas. Os 42 alunos foram divididos em 6 grupos, os quais, durante os pouco mais de quatro meses do semestre (finais de Fevereiro a fins de Junho) apresentaram soluções técnicas para responder ao desafio, materializadas não só em relatório como em maquetas que exemplificavam com rigor o que se propunha. Cada grupo tinha o apoio de um tutor, que com eles passava pelo menos uma hora por semana. O trabalho supunha, ainda, que os alunos apresentassem o resultado físico da produção, ou seja, biodiesel. Na sessão foram expostos os dois melhores trabalhos e os alunos deram conta dos aspectos positivos e negativos da experiência.
O debate que se seguiu (entre alunos e professores que quase enchiam o anfiteatro) mostrou as clivagens existentes: os alunos apoiam este tipo de aprendizagens, os professores dividem-se entre os que estão dispostos a investir na mudança e os que continuam a preferir um ensino arrimado a um programa espartilho. Enfim: com a atitude de suspeita da formadora que referi no começo deste post.
No final, falei com todos os grupos, que tinham as suas maquetas em exposição. Para além das inevitáveis referências a problemas de relação que de vez em quando emergiam no grupo, todos me disseram que tinha sido uma experiência muito gratificante, porque tinham aprendido com prazer, investigado por si. Um deles, sem surpresa, dizia calmamente: “No 1º semestre, nem vinha às aulas teóricas… Neste, passei o tempo a trabalhar aqui e aprendi imenso”.
Fiquei feliz com o que vi e ouvi. É evidente que é necessário repensar a estrutura de todos os cursos, porque nem sempre, com as estruturas vigentes, se poderá conseguir o que, neste curso, neste ano e neste semestre, foi possível. Esse vai ser o grande desafio à Universidade, quando for definido o esquema dos cursos, ainda ignorado.
Para quem queira saber mais sobre biodiesel: veja aqui.