2011/08/06

HÁ QUARENTA E CINCO ANOS…

Regressemos ao que seria expectável para este blog, ou seja, deixar a memória flutuar em vez de abordar temas muito do presente, ainda que nunca tivesse sido excluído estar à tona da água, isto é, a viver o momento que passa.

No dia 6 de Agosto de 1966 foi inaugurada a ponte sobre o Tejo (de seu nome Salazar, na altura, e depois crismada 25 de Abril). Nesse dia eu estava na Parede a gozar alguns dias de férias (acabara o ano lectivo como professor agregado no Liceu de Aveiro e esperava a colocação nesse ou noutro liceu, o que me seria comunicado, como era timbre na altura, na véspera ou antevéspera do início das aulas, que era o 1 de Outubro).

Como nos anos de construção da ponte não estava em Lisboa não convivi com a lenta alteração da paisagem. Sim, porque se hoje a ponte faz parte da cidade, na altura não estávamos habituados a ela… Por isso, cada vez que tinha oportunidade de ver os progressos da obra, ansiava que se completasse. Como todos sabem não existia ainda a parte inferior por onde circulam os comboios, e a minha memória restitui-me uma ponte de maior harmonia, a lembrar a Golden Gate Bridge de S. Francisco.

Ora há quarenta e cinco anos havia a ideia, que se veio a revelar correcta, que haveria uma multidão a querer “inaugurar” a travessia, tanto mais que não seriam cobradas portagens nesse dia. Por isso nem me passou pela cabeça tentar fazê-lo. Mas à noite, depois de jantar, não deixei de, no meu carro de então – um Volkswagen branco, recente – ir até Santo Amaro de Oeiras (creio) onde se divisava já a ponte, toda iluminada, com a interminável fila de luzinhas dos faróis dos automóveis que circulavam (naquele caso, no sentido norte-sul).

Contaram-se histórias curiosas desse dia: as mais comuns referiam casos de curiosos que apenas tentavam ver a ponte de mais perto e que de repente se viam numa via de acesso de sentido único e tinham mesmo de atravessar a ponte, sujeitando-se às filas imensas e a tempos de espera enormes.

Escusado será dizer quanto a ponte sobre o Tejo foi importante, mesmo para uma época em que o parque automóvel era muito pequeno em comparação com o presente.

Praticamente terminaram as passagens nos ferries Lisboa-Cacilhas ou o enorme desvio que era ir para norte e atravessar o rio em Vila Franca de Xira, que apenas merecia a pena para quem fosse para Évora ou Beja.

Foi há quarenta e cinco anos…

2011/08/03

PONTO DE SITUAÇÃO

Decidi esperar durante algum tempo antes de comentar mais sobre o novo Ministro da Educação. Fui-me apercebendo, talvez sem muita surpresa, que alguma coisa estava a mudar e por isso valia a pena esperar para ver se esses indícios de mudança se clarificavam. Após a muito publicitada audiência parlamentar de ontem (2 de Agosto) chegou o momento de me pronunciar.

Entre parêntesis, neste últimos tempos tenho-me dedicado a visitar alguns blogs que tecnicamente são apenas sobre temas de educação, em viagens que por vezes têm tanto de cómico como de dramático. Sei que os professores, ou, pelo menos, muitos professores, têm sido sujeitos a um stress constante e que por isso perdem com facilidade a lucidez. Mas o que se lê nas caixas de comentários é por vezes desconcertante. Muitos que fizeram profissão de fé por Nuno Crato (agora é que “isto” ia entrar nos eixos…) esqueciam-se que na novela do “eduquês” não entravam só os maléficos dos especialistas de educação, mas também os professores “românticos” e preguiçosos que aproveitavam para não ensinar (os “facilitistas”).

Ora bem, o que tem, então, acontecido? Nuno Crato amaciou. Ele próprio explicou a um Prof. Marcelo que o olhava embevecido que uma coisa era criticar quando se estava fora e outra era sentir o peso da governação. O homem que queria implodir o Ministério percebeu que não o podia fazer (por acaso, gostava de saber o que ele, Ministro, disse aos directores-gerais na sua apresentação… tanto mais que tem continuado a trabalhar com eles, por enquanto). Percebeu também que os professores que servem o Estado são funcionários públicos e como tal não pode tratá-los preferencialmente (daí o manter o sistema de quotas). E talvez tenha percebido, também, que sabe um pouquinho menos de educação, a todos os níveis, incluindo o da administração escolar, do que pensava.

Claro que manteve algumas das suas ideias, a começar pela dos exames. Mas ontem reconheceu duas coisas: que a psicopedagogia tem algum préstimo, quando a invocou (!) para fundamentar que um aluno que tenha muitos conhecimentos terá sempre bons resultados em exames; e que há algo de ideológico na defesa (e no ataque) aos exames. Talvez um dia se lhe consiga explicar que não é bem assim, e que a instituição escola, se servida por profissionais competentes e enquadrada numa comunidade interessada e colaborante, pode resolver com êxito a maior parte dos problemas postos por alunos com problemas de aprendizagem.

É certo que Nuno Crato vende a sua ideia de escola mais como o lugar onde se ensina do que o lugar onde se aprende. Aquela discussão de ontem sobre o papel do professor (o professor-treinador, o “coach” que emerge muitas vezes nos teóricos norte-americanos anti-Dewey) foi elucidativa. Há lugar para o coaching, em certas alturas? Diria que sim (pensemos nas Olimpíadas de Matemática…) Mas não como regra.

Depois, há o lirismo de pensar que uma hora de Português e Matemática a mais será remédio: mal não fará, no entanto, ressalvando apenas que a eliminação da área de projecto é um passo atrás (mas atenção, já tinha sido dado pelo anterior governo).

Quanto ao problema nº 1 do Ministro, a célebre ADD, é clero que é um ónus que Nuno Crato nem aprecia nem saberá muito bem como se desembrulhar dele… Seguirei com interesse os próximos capítulos deste romance, que reconheço começou mal com a Ministra Maria de Lurdes Rodrigues.

Em suma: Nuno Crato ao vivo e como Ministro é mais aceitável do que Nuno Crato escritor e liberto de constrangimentos formais. Nota final: não teria sido possível encontrar um naipe de secretários de estado melhorzinho?