Talvez valha a pena dizer mais qualquer coisa sobre “furos” nos horários. O assunto acabou por atrair mais comentários do que esperava (até Miguel Sousa Tavares trata do tema hoje, no Público – indisponível on line…).
Em rigor, a noção de “furo” devia ser limitada a uma falta inesperada de um professor (um horário “bem feito” não deve ter horas não preenchidas). Mas uma chamada “aula de substituição” que consista em prender os alunos a uma sala de aula com um professor porventura desconhecido, nada tendo a ver com a disciplina esperada, “inventando” o que quer que seja apenas para que os alunos não perturbem, no recreio, a vida normal da escola, nunca a entendi nem os alunos a entendem.
Hoje, as escolas têm de ter um projecto educativo; organizam os seus currículos para os quais têm também projectos. Têm assim de prever e conseguir meios para que esses projectos se concretizem, pelo que, na eventualidade de falta de um professor, os alunos devem ter uma área de interesse em que se ocupem de acordo com as suas motivações e o próprio objectivo da escola. Quando a legislação prevê a existência de actividades de enriquecimento curricular vai ao encontro das necessidades de possíveis projectos de cada ano, de cada turma. E essas actividades devem poder ser satisfeitas em qualquer momento, ocupando os alunos sem o sujeitar ao que pode ser considerado uma prisão. A escola é vida, já dizia Dewey, e eu gosto de o repetir.
Deixem-me pôr a memória a funcionar… Quando fui aluno do Liceu de Passos Manuel, em Lisboa, eu sei que há muito, muito tempo, havia professores que faltavam (e eram quase todos excelentes profissionais). E a maior parte de nós, todos rapazes na altura, tínhamos um espaço exterior enorme para andar, para jogar futebol ou à “bolinha”, que era uma espécie de andebol minimizado que se jogava com bolas de papel amachucado com mestria para lhes dar consistência. Tínhamos ainda possibilidade de jogar pingue-pongue e também de ir até à biblioteca. Ou apenas passear, conversar.Ocasionalmente, havia de facto uma aula de substituição. Até me lembro de uma bem especial – dada pelo Dr. José Hermano Saraiva, filho do então Reitor do Liceu, que penso que por falta do professor de Francês nos “entreteve” nessa hora. Mas as folgas, eram normalmente para a brincadeira, para o jogo.
Anos mais tarde, já professor, no Liceu do Funchal, antes do 25 de Abril, estive ligado a actividades dos alunos que na verdade os enriqueciam – um jornal, um laboratório de fotografia, teatro.
E se uma vez por outra o “furo” servir apenas para que os alunos o saboreiem, sem mais, também daí não virá mal ao mundo. Nem a eles.
Ficam por abordar um ou dois pontos. Um deles: há professores que faltam demasiadamente. É um facto e deve ser combatido. Outro: para ter sempre actividades diversas, os professores têm de colaborar e não podem resguardar-se na posição de que “não são pagos para isso”. Mas se “isso” fizer parte da actividade educativa da escola, então não podem (não devem) escusar-se.