2012/07/23

LICENCIADOS E PROFISSIONAIS


Deixem-me contar como descobri que ser licenciado tem um valor limitado. Em Julho de 1959 obtive a minha licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa e dispus-me a concorrer para professor eventual dos liceus, o que efectivamente concretizei (em Agosto ou Setembro, não me recordo bem). Entretanto recebo um telefonema de uma colega de curso perguntando-me se teria interesse, ainda nessas férias, em trabalhar na Junta de Investigações do Ultramar (JIU), numa situação de “tarefeiro” (nesses recuados tempos não havia recibos verdes…).

Claro que disse que sim e dentro de alguns dias fui convocado a comparecer na Junqueira, no palácio Burnay, onde estava sediada a JIU. Foi-me explicado o que me seria pedido: organizar um ficheiro dos mapas referenciados em diversas obras (incluindo leilões) para a secção de cartografia antiga. Trabalho sem complicações.

Entretanto, apareceu o responsável pelo sector (o “posto” nunca cheguei a perceber bem qual era), o Dr. Zeferino Ferreira Paulo, e a primeira pergunta que me fez foi: “Então, o que é que sabe fazer?” E eu, muito ancho da recente licenciatura, obtida ao cabo de quatro anos de estudos e de mais um para elaborar uma tese de 300 páginas e um volume com mais de cem fotografias e desenhos, respondi: “Sou licenciado em Ciências Históricas e Filosóficas!” Creio que vi nele uma cara de gozo quando retorquiu “Isso não prova que saiba fazer alguma coisa! Ser licenciado não é um modo de vida!”

Aí ruiu a minha jactância e devo ter titubeado qualquer coisa que, de facto, não posso reconstituir. Tinham-me dado uma lição – e aprendi-a. Quando em Outubro fui colocado no Liceu de Santarém, assumi que ia ter a minha profissão a sério e como profissional me comportei.