Ouvi na TSF e ainda não conferi a notícia que os jornais deram – o Ministério da Educação, pretendendo moralizar, quer impedir que os professores dêem “explicações” aos próprios alunos. Bom: num primeiro momento fiquei admirado. Eu pensava que era saudável que um professor explicasse aos próprios alunos o que eventualmente eles, depois de estudar, não conseguissem compreender. Não é esse um dos papéis do professor? Depois, percebi: o Ministério estava a referir-se às “explicações” (com aspas), aquele tipo de trabalho a que muitos professores se dedicam nas horas… vagas, recebendo em sua casa grupos de alunos aos quais dedicam uma atenção especializada na sua disciplina (normalmente, disciplina “forte” como a Matemática ou a Física) cobrando honorários que, penso (mas não posso ser definitivo), não costumam ser sujeitos a qualquer imposto.
Estas “explicações” são um hábito muito antigo no país. Quando iniciei a minha vida profissional, há muitos anos, dei-me conta que muitos pais, quando iam matricular os filhos no Liceu, passavam logo por um explicador para marcar vez, mesmo que os filhos fossem bons alunos. O que não era tanto hábito – e confesso que não sei se ele hoje é mais generalizado, mas a decisão ministerial sugere-o – era serem os próprios professores os explicadores.
Eu nunca gostei de ser “explicador”, mas também fui. Ainda antes de me licenciar ajudei um colega amigo que ficara para trás a estudar História e Filosofia para fazer o exame (dizia-se nessa altura do 7º ano, mas correspondia ao actual 11º). Depois, muito episodicamente, voltei a “explicar”, nomeadamente quando fiz o estágio, a um excelente aluno que tinha uns desencontros com o professor de Filosofia e queria mais segurança, e a um menos bom, ainda que simpático, que andava ele próprio desencontrado consigo próprio… Recordo-me que nessa altura o valor de uma hora de trabalho andava pelos 40$00 (ainda se lembram do $?!) ou seja, qualquer coisa como 20 cêntimos (€ .20). E, claro, também não paguei qualquer imposto!
Depois disso, nunca mais dei “explicações”, mas penso que expliquei bastante aos meus alunos quando tinham dificuldades. Por vezes com sucesso, outras sem sucesso…
Ora bem. São condenáveis, as “explicações”? Não serão condenáveis, mas descontadas as excepções, constituem um absurdo razoável, resultante da maneira como a escola assume o seu papel (escola, como um todo: professores incluídos). Em princípio, a escola deve providenciar para que os seus alunos aprendam no enquadramento que ela lhe fornece, dispensando apoios exteriores sistemáticos. É o professor que escolhe a estratégia de ensino-aprendizagem que utiliza: nessa estratégia devem estar incluídos os passos para ajudar aqueles alunos mais lentos, com maiores dificuldades. Porque esses precisam mesmo de explicações, mas explicações sem aspas, dadas no momento certo pelo professor certo; as “explicações” (com aspas) até podem colidir com a estratégia seguida e fazer mais mal do que bem. Ah! Mas se for o próprio professor, então tudo faz algum sentido…
Falta dizer que as explicações não são hoje dadas a 20 cêntimos a hora, que muitos pais não as podem pagar; falta dizer que apesar das explicações continuam a registar-se altas taxas de reprovação. O que sugere que os males que afectam a educação são muitos e há muito que fazer para alterar o que está mal. O que começo a duvidar é que os que deviam ser os mais interessados queiram mudar.
Fico por aqui…
1 comentário:
O mundo das explicações é um mundo subterrâneo:
Para os alunos, porque corresponde à falta de vontade, de trabalho e de disciplina/oraganização de muitos alunos que não querem sequer fazer o esforço individual necessário, e depois ocupam todo o seu tempo livro om explicações.
Para os professores, que vêem muitos dos seus alunos recusarem quase todo o tipo de trabalho na aula e em casa, com a explicação de que depois fazem tudo na explicação (ou o suposto explicador lhes faz quase tudo...). Muitos professores vêem os seus métodos de trabalho totalmente destruídos, boicotados, e os resultados acabam sempre por ser da sua repsonsabilidade. O explicador desculpa-se com os professores...
Para as escolas, que pouco fazem para combater este estado de coisas, embora o seu papel não seja nada fácil.
Para os pais, porque muitos facilitam esta realidade, favorecendo melhor o explicador e o seu papel do que a escola e o que os seus filhos lá deviam fazer. Exemplo: é mais fácil um pai criticar o seu filho por se portar mal (não trabalhar) no explicador do que na escola.
Tudo isto junto, dá os resultados que conhecemos.
E há a questão da moda. Se os bons alunos andam no explicador, todos os outros pensam que é no explicador que eles ficam bons.
Enfim!
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