… neste mesmo dia, atingi o limite de idade para exercer
funções públicas, e por isso, de acordo com a tradição universitária, “dei” a
minha ultima lição perante algumas dezenas de amigos e ex-alunos. Tive ocasião
de recordar, então, as palavras de Vitorino Nemésio no dia da sua jubilação:
“Dou a minha última lição de professor na efectividade e em exercício, segundo
a lei. Claro que a lei só tira o exercício ao funcionário: o homem exerce
enquanto vive”, fazendo-as minhas. E
assim tenho procurado viver estes anos, sempre interessado pelas coisas da
educação, embora sentindo a cada momento que me distancio do que é actual. À
minha última lição dei o título A
Educação de Ontem e de Hoje: foi ao mesmo tempo um exercício autobiográfico
e de análise à evolução da educação em Portugal na segunda metade do século XX.
Reli ontem o que escrevi. O que para
mim fazia sentido em 2006 continua a fazê-lo dez anos depois. A educação, como
aliás acontece em todas as áreas sociais, é um campo aberto para a discussão:
ela não é imune a ideologia. Logo após o 25 de Abril, contudo, foi possível
encontrar consensos que permitiram avanços significativos na construção de um
sistema educativo diferente daquele herdado dos tempos duros da ditadura. Encontrei-me,
nessa busca de consensos, com muitos outros, que tinham ideais diferentes, mas
que, como eu próprio, foram capazes de uma síntese positiva.
Nestes dez anos, assistimos a uma tentativa de regresso a um outro
sistema educativo – aquele que se baseava na discriminação para a criação de
elites, valorizando mais o ensinar do que o aprender, sobrepondo critérios
económico-financeiros a critérios pedagógicos. Assisti a esse ataque
consternado, mas mantive a esperança de que mais tarde seria possível pôr no
rumo certo a educação em Portugal. Dizia, a findar a minha última lição, o
seguinte:
“Eu tenho uma confiança enorme no futuro, derivada de um optimismo que
tenho conservado ao longo destes 70 anos e de que raras vezes me afasto. Por
isso recuso a ideia de que a educação em Portugal esteja moribunda. Penso,
aliás, que há uma dezena de anos se começou a estruturar uma solução que
poderia ter dado às escolas o papel relevante que devem ter num país avançado.
Pode acontecer que, se prevalecer o bom senso, as iniciativas que o actual
Ministério da Educação tem tomado e parece querer tomar, se compaginem com a
filosofia básica de uma flexibilidade curricular que acomoda a diversidade, a
todos os níveis, procurando garantir para todos os alunos o direito a uma vida
digna pela educação recebida”.
O Ministério é diferente, o Ministro é outro: apesar disso (talvez porque
sou optimista…) quero acreditar que, mais do que voltar a 2006, é possível uma
mudança qualitativa, pensada no presente e perspectivando o futuro. Pelo menos
hoje, dia dos meus oitenta anos, quero mesmo acreditar…
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