No dia em que li, um pouco pela rama, o Despacho nº 14 753/2005 (2ª série) da Ministra da Educação, sobre o ensino do Inglês no 1º ciclo, decidi de imediato que ele merecia um post. Cheguei mesmo a prometê-lo num comentário a um texto que a Saltapocinhas, sempre atenta, publicou. Mas só hoje, descansadamente, li todo o despacho; por isso só hoje escrevo o que sobre ele penso.
A iniciação a línguas estrangeiras é um dos objectivos para o ensino básico consignados na Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº 46/86, de 14 de Outubro). Mesmo ao nível do 1º ciclo já existem experiências dessa iniciação, sobretudo do Inglês.
De há muito que defendo que a aprendizagem do Inglês deveria começar no 1º ciclo, por duas razões essenciais. A primeira é que quanto mais novo se é maior é a capacidade para se aprenderem línguas estrangeiras. A segunda é que saber Inglês é praticamente indispensável na vida de qualquer pessoa, já que a língua inglesa se tornou numa língua universal.
Portanto, apoiei e continuo a apoiar a decisão do Governo, que, de acordo com o já referido despacho, pretende promover um “um programa de generalização do ensino de inglês nos 3º e 4º anos do 1º ciclo do ensino básico”.
Simplesmente, os termos do despacho decepcionaram-me. Durante alguns anos, o Ministério da Educação procurou habituar, em especial os professores, a uma linguagem rigorosa que seria importante consolidar e não destruir. A reorganização curricular levada a efeito pelo Ministério de Marçal Grilo (embora a mentora dessa reorganização tivesse sido Ana Benavente) tentou identificar o que era, de facto, o currículo, termo que todos usavam mas poucos compreendiam. Um dos vectores fundamentais da mensagem esclarecia que currículo era tudo o que a escola organizava tendo como fim as aprendizagens dos alunos, fossem quais fossem as suas bases. Uma disciplina faz parte do currículo; mas uma actividade desportiva – se a Escola a pensou para os seus alunos – é, também currículo. E – sabem-no bem os professores – até foram definidas actividades curriculares não disciplinares, para mostrar bem que áreas como o estudo acompanhado, não sendo uma disciplina, eram currículo.
Ora é lamentável que o Inglês surja, agora, como actividade ”extracurricular”, num retrocesso “oficial” (porque num despacho ministerial) que lançará, no mínimo, alguma confusão entre os professores que haviam percebido a mensagem anterior. E eu digo que isto é lamentável porque cria a dúvida acerca das assessorias da Senhora Ministra, que deveriam ter a formação suficiente para alertar para o desconchavo de chamar extracurricular a uma actividade tão relevante e tão marcadamente influente na vida escolar dos alunos como a aprendizagem do Inglês. (Como se vê, estou a dar como aceitável que a Ministra, cuja formação em educação me parece ser lateral, e estava ligada ao ensino superior, desconheça estes aspectos).
Esta minha preocupação não é menor. É importante que os professores assumam que tudo o que a escola faz tem de ser importante para as aprendizagens dos alunos, e que aproveitem todas as oportunidades para as cruzarem entre si. Se continuarmos a querer ver o currículo como uma soma de disciplinas, afastando dele outras aprendizagens, estaremos a consagrar um tipo de escola ultrapassado e a passar uma mensagem errada aos professores (como no início da chamada escola cultural se passou, contrapondo-a a uma escola curricular, numa infeliz etiqueta que, depois, deixou de ser utilizada, e bem, por se ter compreendido que ela não podia corresponder à realidade).
Para além desta minha discordância, outros pontos do despacho e do Regulamento suscitam-me dúvidas. O sistema de parceria parece-me realista, mas excluir à partida a capacidade de um agrupamento, ou mesmo escola isolada, poder ser candidato ao apoio financeiro, não será estranho? A menos que possam ser considerados integrados na alínea e) do nº 1 do artigo 3º do Regulamento, mas não me parece. Também ponho algumas reservas à capacidade de uma Comissão de Operacionalização e Acompanhamento com a composição indicada, mas esse é um ponto a ver.
Por hoje, fico por aqui.
1 comentário:
Nunca vi tal Despacho, parece que as leis não são para chegar às mãos de quem as vai aguentar...
Acabei há bocado de fazer o rascunho da acta da ultima reunião lá do agrupamento. E escrevi lá (porque só me lembrei quando estava a fazer a acta, mas o resto do pessoal aprova com certeza) que acho (achamos)uma tremenda injustiça o que se está a passar. A ser extra curricular o inglês só vai funcionar nas escolas que tenham condições físicas para isso. No meu agrupamento há duas escolas, incluindo a minha, que à partida não têm. A minha escola tem APENAS 2 salas de aula, ocupadas das 8 da manhã às 18:15.
Se entretanto outras escolas do mesmo agrupamento, porque têm salas livres vão facultar aulas de inglês aos seus meninos, gera-se uma grande injustiça quando eles depois juntarem no 5º ano (e na mesma turma!) alunos que já têm 2 anos de inglês com outros que nunca tiveram! chama-se a isto "pôr a carroçà à frente dos bois" mas eu espero que entretanto algum espírito iluminado lá do ME se lembre destes casos (ou então que leia o teu blog!)
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