2005/09/22

A destreza das dúvidas

O blog do Luís foi dos primeiros que me suscitou uma curiosidade continuada e de certeza foi o primeiro no qual comentei. A partilha que o seu Autor fazia (e faz) da sua experiência de doutorando nos Estados Unidos aproximou-me, talvez por (com todas as diferenças) eu ter sido também um “exilado” nos States com o mesmo objectivo. Agora, que sei que o Luís terminou a tarefa, para além dos parabéns que já deixei no seu blog, quero igualmente assinalar, neste meu quase diário de memórias, a alegria que sinto pelo “novo” colega. Vou esperar pela descrição do seu doutoramento – que nos Estados Unidos é coisa séria mas desdramatizada em termos de encenação (o que não quer dizer que não haja, depois, esse momento de encenação), quando se entregam os diplomas.
Recordo o meu doutoramento: numa sala pequena, de seminário, com uma única assistente, uma colega brasileira que me pediu para ir, lá estava eu e o júri de cinco membros, à volta de uma mesa, todos em mangas de camisa, a discutir a tese, durante cerca de duas horas, num acto simples mas profundamente honesto. Para trás, ficavam três anos e meio de trabalho aturado, dois deles a construir a dissertação, sempre apoiado pelos meus dois orientadores, com tarefas marcadas, mas sem haver o mínimo sinal de imposição. Sempre que eu discordava, dizia-o claramente e, como se diz agora, “não havia crise”, teria de se chegar a um consenso. Devo dizer, porque é verdade, que tive colegas que se queixavam amargamente da maneira como eram orientados; não foi o meu caso.
Fiquei sempre preso a esse tempo, lamentando apenas que tivesse sido tão tarde. Nisso, o Luís (e como ele tantos outros) teve a sorte de viver noutros tempos. Que seja feliz na sua vida académica (e não só, claro)!

5 comentários:

saltapocinhas disse...

Deixo já aqui os parabéns ao Luís (e depois vou lá a 2casa" dele). Engraçado que a ideia que eu tenho dos doutoramentos é assim uma espécie de teatro com muitas personagens vestidas de forma estranha...e o conteudo do estudo fica a parecer o menos importante!

Cândido M. Varela de Freitas disse...

E tens razão! Em Portugal (e em outros países europeus, sejamos justos) há ainda muito folclore associado às provas académicas (só os mestrados conseguiram escapar). Eu compreendo o peso da tradição, a Universidade entre nós tem centenas de anos de existência e carrega com ela o peso da herança, que tem muito a ver com essas práticas. Nos Estados Unidos o académico é mais simples.

Anónimo disse...

Muito obrigado.
Ainda estou nos EUA, regresso esta noite, chegando a Portugal amanha de manha. Penso que teremos oportunidade de nos encontrarmos por Braga (embora nestas primeiras duas semanas va' ser dificil). Logo que encontre tempo deixarei o meu testemunho na "destreza"

Acilina disse...

Já felicitei o Luís pelo êxito do seu doutoramento. Fiquei espantada pela rapidez! Quando me lembro que depois de ter acabado e entregue a minha tese de mestrado (muitas cópias) tive de ficar vários meses à espera da discussão... e eu estava cheia de pressa, pois aproximava-se uma oportunidade de progressão na carreira para a qual era indispensável ter o mestrado concluído. Acontece que um dos elementos do juri era (da FCL - UL)de fora da minha universidade e era preciso pedir autorização para que fosse discutir a minha tese. Pois nessa altura havia uma norma (não sei se ainda há) em que depois de o pedido dar entrada, se ao fim dum mês não houvesse resposta, considerava-se aceite. Assim era usual deixar o pedido apodrecer em cima duma secretária porque o assunto se resolvia por si. Toda a gente esperava esse mês, mais os outros que as burocracias exigem... Mas não é só isto! O meu mestrado (no IST - em matemática)durou 4 anos. Não fiquem a pensar que foi por culpa minha! foi assim para todos os que fizemos esse mestrado. Dois anos de parte escolar (muitas disciplinas e respectivos exames) e 2 anos de elaboração da tese, com muitas discussões com o orientador e vários seminários. Agora o mestrado não vale nada. Com Bolonha, passa a ser os 2 últimos anos das anteriores licenciaturas. Mas não é tudo. Ao ler a descrição do doutoramento de Varela de Freitas (em mangas de camisa...) sorri... ao lembrar-me da pompa e circunstância da discussão da minha tese de mestrado. Os elementos do juri usavam as suas pesadas e sumptuosas vestes académicas...

Não há dúvida que há uma diferença colossal entre os Estados Unidos e Portugal!

Mesmo agora, este ano, um candidato a doutoramento em matemática no IST tem de submeter-se a um exame de admissão em que, nos 2 últimos anos, só passaram 2 alunos. Todos os outros chumbaram. Pessoas que completaram as licenciaturas com médias de 17 chumbaram. Só passaram os alunos de 20...

Como é diferente um doutoramento em Portugal!

Cândido M. Varela de Freitas disse...

A Homoclínica

Há realmente um mundo de diferenças, que atribuo a um certo atavismo dos nossos universitários mais petrificados e que se tem perpetuado, não sabendo eles distinguir entre a beleza de preservar uma tradição e a necessidade de a modificar. Mas as coisas estão a mudar. Nos EUA a burocracia é mínima. Um exemplo: entre a entrega da minha tese e a sua discussão mediaram 30 e poucos dias. A tese foi entregue, por encadernar, numa secção do Graduate College, às 9 da manhã, para verificar se estava conforme as regras (aí, foram estritos: margens, indentação de parágrafos, quadros e figuras), foi tudo passado a pente fino. Eu julgava que estava tudo certo: pois recebi página e meia de emendas para fazer... Mas o que me causou mais espanto: às três da tarde do dia em que enrteguei, telefonaram-me a dizer que podia ir lá buscá-la!
Quanto à exigência, creio que é claro que ela deve existir e existe nos EUA. Os cursos de graduação são exigentes na maior parte das universidades com prestígio.Entre nós há por vezes manifesto exagero, por exemplo na dimensão da tese. Já argui aqui teses com mais de 400 páginas, o que é um perfeito disparate!
Eu entendo as vestes "festivas" em ocasiões festivas mas para mestrados e doutoramentos... Bem, aqui no Minho os mestrados já são aligeirados.