2005/12/21

Os lugares onde vivi – (5) Viseu (1961-1963)


Quando regressei da Horta, em 1961, voltei a concorrer, como professor eventual, para o novo ano lectivo. Queria fazer o estágio, para entrar na carreira que sempre ambicionara, mas entrar no estágio era, na altura, uma tarefa complicada. Os candidatos eram obrigados a fazer um exame de admissão que era considerado de grande dificuldade, na medida em que os seus conteúdos eram todos os cobertos pelos programas de História e Filosofia mas tratados “a nível universitário”, o que, como se compreende, causava uma certa intranquilidade. Aliás, corriam histórias (verídicas) de candidatos de grande qualidade que haviam sido reprovados.

Ora eu sentia-me tentado a fazer o exame, mas precisava de mais preparação. Os dois anos anteriores tinham sido ricos, porque dera praticamente todas as matérias, mas não me sentia de modo algum seguro.

Fiquei, de novo, em Santarém, onde fui recebido de braços abertos. Mas não iria ficar lá por muito tempo, porque me aconteceu o inesperado…

Dias depois de ter começado as aulas, num sábado à tarde encontrei em Lisboa, na Livraria Portugal, um bom amigo que me ajudara imenso a desbravar os meus conhecimentos de arqueologia pré-histórica, o Dr. Bandeira Ferreira, que trabalhava no Museu Etnológico Doutor Leite de Vasconcelos, em Belém. Na conversa, perguntou-me se eu não quereria ocupar o lugar de professor de Psicologia de uma Escola do Magistério. Tinha saído legislação recente que remodelara as Escolas, e que afectara a cada uma um lugar de professor de Psicologia, a ser ocupado por um licenciado em História e Filosofia (não esqueçam que não havia cursos de psicologia em Portugal), e ele (Bandeira Ferreira), que de algum modo tinha ligações ao gabinete do Ministro (na altura, um professor de Coimbra, Manuel Lopes de Almeida), andava precisamente à procura de possíveis candidatos. Esses professores seriam providos precariamente mas dois anos depois fariam um concurso para se tornarem definitivos.

Achei que era uma hipótese agradável, embora não soubesse muito de psicologia (pelo menos, achava que não sabia): só tinha tido três disciplinas, Psicologia geral, Psicologia Experimental e Psicologia Escolar e Medidas Mentais. Falou-se vagamente da hipótese Porto – porque Lisboa já estava preenchida pelo Fernando Castelo Branco.

Ficou de me telefonar, e aguardei. Só nos primeiros dias de Novembro recebi o telefonema: a oferta era Viseu. E aceitei.

Já conhecia razoavelmente Viseu, porque durante alguns anos passara férias na terra de uma cunhada, em Canas de Senhorim. E assim disse adeus a Santarém, onde tive uma despedida afectuosa, e no dia 11 de Novembro de 1961 apresento-me ao serviço na Escola do Magistério Primário de Viseu, que estava na altura sem director, porque o anterior saíra e aguardava-se pela nomeação do seu sucessor, que viria a ser o Dr. António Correia de Barros.

Estive em Viseu dois anos, dois importantes anos da minha vida profissional, já que estudei a sério psicologia e aprendi imenso.

Viseu era, na altura, uma cidade com muito menos rotundas do que hoje (mas já com algumas…) e sem toda a urbanização que hoje cobre os arredores próximos, mas era já uma bela cidade, que sempre soube preservar o seu centro histórico e, fora dele, procurar crescer com alguma harmonia. Uma cidade em que apreciava as generosas zonas verdes, das frondosas árvores do Rossio ao Fontelo, não esquecendo o parque fronteiro ao Liceu. Era também uma cidade com muita vida, animada por centenas de estudantes e por ser um centro comercial de grande importância. Estou a falar no passado porque me reporto aos começos dos anos 60, mas é evidente que tudo isto é também o retrato do presente. À volta de Viseu, a pouco mais ou menos de 20 quilómetros, existem povoações importantes para quais é um pólo de atracção: Mangualde, Nelas, Tondela, S. Pedro do Sul, Sátão são pontas de uma estrela de que Viseu é centro.

Na altura em que lá vivi, faltavam salas de espectáculos decentes mas não faltavam os bons restaurantes e pastelarias (a Santos creio que já não existe, mas a Horta penso que ainda resiste, e ainda bem, porque os docinhos de ovos eram e devem continuar a ser uma maravilha!).

Para não alongar este post, deixarei para o seguinte mais algumas reflexões sobre o tempo que vivi em Viseu.

2 comentários:

saltapocinhas disse...

A minha "professora primária" era de Viseu (mais propriamente de Nelas). Eu entrei na escola em 64 e ela era muito novinha (claro que eu a achava velha...) mas ainda pode ter sido tua aluna!

Cândido M. Varela de Freitas disse...

Pode ter sido! Os meus alunos (e minhas alunas, claro!) terminaram em 1963. Lembras-te do nome?
E já agora, bom Natal!