2010/08/05

Mais sobre retenções

Como se esperava, houve reacções negativas à proposta lançada pela Ministra da Educação, e ela própria, em declarações que ouvi, via televisão, foi menos clara do que na entrevista ao Expresso. Aliás, uma proposta é uma proposta, e pareceu-me que para além da ideia principal (terminar com o conceito de “reprovação”, que prefiro ao tradicional “chumbo”) há ainda pouca elaboração.

Já agora, mais algumas reflexões sobre o tema. Independentemente de ter aplaudido a ideia e de estar convicto que a razão está do lado dos que advogam o termo das reprovações, há que ter em conta que em educação a “verdade” não é simples. Mesmo na Finlândia são possíveis repetências, embora factos raríssimos; e nos Estados Unidos cada Estado pode adoptar modelos diferentes face às retenções. A investigação parece provar que a retenção de alunos é negativa a vários títulos, mas (como aliás é muito normal em educação) há sempre estudos que não comprovam completamente a tese. Recebi há dias o último número da Educational Evaluation and Policy Analysis (Junho de 2010, 32-2) e nele é publicado um artigo (“An investigation of the relationship between retention in first grade and performance on high stakes tests in third grade”, de Hughes, Chen, Thoemmes e Kwok) , no qual se relata uma cuidada investigação comparando os resultados obtidos (em testes no 3º ano) por 769 alunos do Texas, retidos e não retidos no 1º ano. Os autores concluem dizendo que “os resultados sugerem, mas não provam, que os alunos retidos no 1º ano estariam mais bem preparados para ter sucesso no teste do que se tivessem passado para o 2º ano”. Repito: isto é muito comum em educação (e não só em educação: não vemos nós a ciência médica de vez em quando pôr em causa “verdades” estabelecidas?) pelo que, usando um termo muito popular entre os estatísticos a propósito de sondagens, estes resultados "valem o que valem"....

Em qualquer caso, o que é necessário é encontrar modelos de apoio pedagógico e social que salvaguardem a satisfação das necessidades de todos os alunos. É muito evidente que há alunos que não serão nunca capazes de atingir os mesmos resultados (objectivos, competências, “metas”…) esperados de um aluno médio: para esses existem já situações de apoio particulares e que vi funcionar de forma exemplar recentemente. Ampliar os recursos existentes é uma da condições para que a proposta da eliminação das repetências seja possível.

2 comentários:

saltapocinhas disse...

Olá Prof. Varela!

Já há muito tempo (alguns anos) que eu acho inútil reprovar alunos (não todos, mas a maioria dos casos), pelo que acho que a Ministra pretende tomar uma posição corajosa. Espero que o consiga.

No entanto, tenho tido alguns alunos que beneficiaram bastante em fazer o 1.º ciclo em 5 em vez de 4 anos.São normalmente aquelas crianças que não conseguem aprender a ler num ano de escolaridade, mas que o conseguem em 2 e daí seguem o percurso normal. Infelizmente, para obviar esta situação de crianças que demoram 5 anos a adquirir as competências do 1.o ciclo não há outra alternativa a não ser a retenção.
Por outro lado, aqueles alunos que sabemos que nunca atingirão o nível de competências "normal" em cada ciclo de escolaridade, não ganham nada em prolongar a sua estadia (muitas vezes contrariada) na escola.
E agora, com a escolaridade obrigatória até ao 12.º ano, seria uma barbaridade tanto para os alunos como também para professores, prolongar a sua permanência na escola.

Cândido M. Varela de Freitas disse...

Então, terás sido uma das pessoas que de vez em vez vinhas espreitar a "Memória"... Obrigado. Desde que me reformei (não gosto nada da palavra, mas acho um pouco pedante dizer que "me jubilei") perdi muito da minha vontade em comunicar. Talvez agora volte mais vezes.
Sobre o post: é evidente que há alunos que por muitas razões diferentes nunca aprenderão o suficiente para poderem satisfazer com os mínimos estabelecidos (sejam eles quais foram: objectivos, competências, conhecimentos). O que não acho aceitável é obrigar uma criança, jovem, a repetir anos e anos sem esperança de resultados. Tens razão.